segunda-feira, 10 de maio de 2010

As mulheres de Freud





Resenha por Maria Elizabeth Bonow

Livro: As Mulheres de Freud
Título original: Freud’s Women
Autores: Lisa Apignanesi e John Forrester
Tradução para o português: Nana Vaz de Castro e Sofia Maria de Sousa Silva

O instigante título do livro não decepciona aos leitores, ao consolidar, numa deliciosa linguagem limítrofe entre o romance e a psicanálise, um texto contundente sobre as mulheres que aparecem envolvidas na biografia pessoal e profissional do pai da psicanálise: Sigmund Freud.

A experiente autora Lisa Apignanesi é romancista, escritora e resenhista, ex-professora universitária e diretora do London Institute of Contemporary Arts. Seu parceiro de autoria é John Forrester, emérito professor de história e filosofia da Universidade de Cambridge, especializado na biografia de Freud e autor de diversas obras ligadas à psicanálise.

A maior diferença desse texto é sua perspectiva que, diferentemente de famosas biografias de Freud, como as de Peter Gay e Ernest Jones, é tomada a partir das mulheres que povoaram a sua vida. Elas são indubitavelmente as protagonistas da obra: “as famosas histéricas do fim do século XIX, natural e historicamente destinadas a ser suas parceiras de criação da psicanálise”.

Os autores prospectaram em fontes diversas - biografias dos autores citados, correspondências das mulheres a Freud e a outros personagens envolvidos, entrevistas com familiares, Museu de Londres, teses publicadas, relatos dos amigos e profissionais relacionados, entre outras – que lhes permitiram erigir uma sólida versão da reconstituição de suas vidas e sua importante participação no estabelecimento das descobertas sobre o inconsciente, a sexualidade e o feminino.

Inicialmente aparecem as histórias relativas às figuras mais remotas, como sua adorada matriarca Amalie, irmãs e babás sedutoras, que vivenciam experiências familiares relevantes, especialmente as “formadoras na infância” do menino Sigismund, capazes de corporificar sua posterior autoanálise dos primeiros anos.

Na medida do tempo, desfilam paixões como Gisela Fluss e a sobrinha Pauline, até seu arrebatado pedido de casamento à Martha Bernays, escolhida segundo o padrão da mãe, constituindo por 53 anos um “mundo de felicidade”. Também entra em cena a forte presença da cunhada Minna Bernays, confidente mais próxima e de língua afiada, assim como as difíceis vidas da filhas Sophie, Mathilde e Anna, educadas por “um pai judeu afetuoso, severo e carinhoso, por vezes distante e alheio”, como se autointitulou o próprio Freud. Anna tornou-se a preferida e a herdeira da psicanálise, permanecendo ao lado do pai até o fim, quando a ela Freud pede autorização para tomar a injeção que acabaria com o sofrimento do câncer que o consumira.

As vidas, anteriores e posteriores aos tratamentos analíticos, das pacientes e amigas Anna O., Cäcilie M., Emmy Von N., Katharina, Elizabeth Von R., Lucy R., Dora são investigadas e reconstruídas pela incansável pesquisa de tantas fontes, capazes de preencher os espaços deixados pelos fragmentos dos relatos de Freud e saciar a curiosidade dos leitores.

O texto percorre as comoventes biografias e contribuições de Sabina Spielrein, Löe Kann, Lou Andréas-Salomé, mulheres preciosas à causa psicanalítica, além de Helene Deutsch, Marie Bonaparte, Joan Riviere, Alix Strachey. Cada qual é homenageada pelos substanciais elementos que permitiram o aprofundamento sobre o saber feminino, muitas delas dedicando a Freud um amor filial e seguindo os passos do mestre.

O livro é aberto e concluído com o debate sobre a mulher, enfrentado por Freud, diante do movimento feminista. A polêmica esteve sempre presente na psicanálise e era inerente às apresentações das teses de Freud, especialmente no que concernia à sexualidade feminina.

As mulheres de Freud são ‘uma a uma’ relacionadas cronologicamente e alinhadas às descobertas psicanalíticas, num trabalho minucioso e ousado. É uma leitura obrigatória para psicanalistas e biógrafos, assim como altamente recomendada aos interessados pelas questões do feminino e das personalidades que marcaram a história da humanidade.

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