terça-feira, 17 de janeiro de 2017



As 3 telas de Tarsila repetem reminiscências, seu inconsciente, seus significantes, sua alienação, sua fantasia. Na repetição, faz emergir o encontro faltoso com o real, conforme aduz Lacan. 
A repetição é a estrutura que fundamenta a sublimação e remete à dimensão da satisfação. 
A sublim[e]ação é a construção que realiza algo, na moldura simbólica do real possível. 
Freud, ao analisar Leonardo Da Vince conjuga a satisfação com a repetição, em sua forma mais radical.



quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Trarei à reflexão algumas ideias que destaco, entre comentadores de arte e psicanálise, acerca da articulação Dalí e Psicanálise. A primeira autora é Tania Rivera.

Dalí: mais além da realidade I.

Rivera[i] (p.20) analisa algumas passagens históricas dos comentários de Freud sobre Dalí.

Ela fala da perplexidade de Freud diante da arte moderna e, mais ainda, ele “faz troça” da associação entre a sua psicanálise e surrealistas. Observações feitas, após um encontro entre Freud, Stefan Zweig, Salvador Dalí, Gala e o milionário Edward James, ao saber que os surrealistas o tinham adotado como “santo padroeiro”.

Freud chama-os de loucos (ou “loucos a 95%, como se diz no álcool), mas o jovem artista espanhol (Dalí) o teria feito mudar de ideia, “com seus olhos cândidos e fanáticos”. Freud admite que seria interessante examinar de um ponto de vista psicanalítico a realização de um quadro como aquele.

O quadro era Metamorfose de Narciso.

MaterialTinta a óleo
PeríodoSurrealismo
Criação1937

“O quadro faz o contemplador participar ativamente do processo de transformação: diante dos seus olhos Narciso, recurvado sobre o espelho d’água, pertrifica-se numa forma de mão que segura um ovo, de onde irrompe a flor narciso. Imagens duplas se auto-engendram, partilham os mesmos contornos, são intercambiáveis, de tal maneira que o contemplador vê o quadro se metamorfosear diante dele” (Rivera, p.24)


Sentencia Freud, diante daquela obra, que “nas pinturas clássicas, procurava o inconsciente – em uma pintura surrealista, o consciente”.

E Rivera (p.21) conta que, mesmo despertando o interesse de Freud por sua genialidade, foi um veredicto para Dalí que significou a sentença de morte do surrealismo.





[i] Rivera, Tania. Arte e Psicanálise. Jorge Zahar Editor. 2ed. Rio de Janeiro, 2005.

sexta-feira, 7 de março de 2014

Mulher-Lua

Volto hoje a escrever no meu amado blog, inspirada pelo dia internacional da mulher, ilustrando com essas mulheres admiráveis: Cecília e Tarsila.

Tenho fases, como a lua 
Fases de andar escondida, 
fases de vir para a rua... 
Perdição da minha vida! 
Perdição da vida minha! 
Tenho fases de ser tua, 
tenho outras de ser sozinha. 
(Lua Adversa - Cecília Meireles)

Mulher de fases, mulher-fases, mulher-lua.

Quando alguém se aproxima de uma fase, lá vem outra complicar.

Não é proposital, não é do mal, é simples como uma nota musical.

Ora aqui, ora ali, construindo melodias, tecendo amores, protegendo escapes secretos, por onde se esvai e se reconstrói.

A mulher busca as palavras de amor no Outro, pois delas faz seu tecido e se recobre de gozo.

Palavras de amor vão e vêm.

E do fantasma do abandono, ela alça novo vôo, novas descobertas no profundo mergulho que faz em si, voltando a ser seu centro, para se saber tão valiosa, seja em dor ou em encanto.


Para que saber o que querem? Apenas as deixem ser como a lua.

domingo, 7 de abril de 2013

A maçã e o desejo feminino.


A maçã do amor, o fruto proibido guarda tanto simbolismo ao longo das gerações.

Para ser desejada, foi vetada à mulher, demarcando um limite, estabelecendo uma porta à transgressão, denunciando uma divisão.

Assim, tornou-se signo da violação da lei, do crime feminino, do caminho ao sexo, à erotização mítica, ao objeto fálico.

As tentadoras maçãs, em seu fascínio, são sempre apresentadas por outras figuras femininas poderosas - a serpente, a bruxa, a madrasta - representações do mal, portadoras de um saber envolvente, irresistível, uma vez que já foram eleitas por um homem.


Eva, a mente de maçã, 2008 - Applemind
Óleo s/ tela, 50 x 60 cm - Surrealismo Anacrônico


Não obrigam, não invadem, não agridem, somente apontam uma insatisfação desconhecida, um desejo mais íntimo, o gozo. É um apelo a algo que está significado por uma outra mulher como uma verdade, a nomeação de uma falta aparentemente mais-além dela, um gozo específico.

O objeto oral, que desempenha um papel essencial nas trocas com o Outro, equaciona na maçã uma fórmula de satisfação que se repete, uma espécie de rito de passagem à feminilidade, à vida amorosa.

A maçã é o desejo de desejar, é o desejo feminino.

terça-feira, 19 de março de 2013

Angústia e Arte.


Angústia é afeto ligado à perturbação, um afeto que não se engana, de grande interesse à psicanálise e à criação.

De que matéria é feita a angústia?
 
Ela é esculpida na dor da falta e é lançada ao Outro com a pergunta: o que quer de mim? A resposta interior é uma suposta manifestação do desejo do Outro, uma bússola que suaviza o mal-estar.
 
Cada um de nós encontra o tamponamento do buraco da falta, nomeando-o de – dinheiro, João, Maria, Prozac, Iphone5, Ferrari, comida, ginástica, droga – recobrindo sempre de forma passageira, insatisfatória, incompleta e ávida por mais e mais.

(Angústia - E.Munch - 1894)
 
A arte também se  constrói na angústia, na insatisfação, no questionamento, na falta. E quem é o artista senão aquele que se propõe, por alguns instantes, a promover uma resposta, a recobrir a tela em branco para, a seguir, voltar à falta?

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Vou beijar-te agora, não me leve a mal, hoje é Carnaval


Quero confrontar alguns elementos do conceito de fantasia para a psicanálise e a fantasia que surge nos blocos de rua, nas passarelas da avenida, nos olhares dos foliões.
O Carnaval é o período de licença para a fantasia, transbordamento do interior do sujeito, um ato falho, simbolizado no descolamento da realidade por três dias.
- Quem é você?
- Adivinha, se gosta de mim! (Chico Buarque)


É o diálogo entre analista e analisante, no qual o inconsciente é a bússola que indica por onde seguir. O inconsciente determina o sujeito a partir da constituição da fantasia, faz com que ele vislumbre o mundo sob esta ótica própria. A fantasia emoldura, enquadra a realidade.

A fantasia é um dos conceitos que fundamentam a psicanálise, desde que Freud ensinou que a realidade é a realidade psíquica, isto é, a de cada um de nós. 

 
Baile Popular - Di Cavalcanti

A criança em crescimento, quando para de brincar, só abdica do elo com objetos reais; em vez de brincar, agora ela fantasia. Constrói castelos no ar e cria seus devaneios. A diferença das fantasias entre crianças e adultos é que crianças não ocultam o desejo que a fantasia representa, mas os adultos envergonham-se de suas fantasias por serem infantis e proibidas. (Freud)

Mas, no Carnaval, elas emergem como sonhos, harmonizadas com censura interior, legitimadas pela sociedade, e se espalham pelas ruas.

Carnaval? Deixei a dor em casa me esperando. E brinquei e gritei e fui vestido de rei. Quarta-feira sempre desce o pano. (Chico Buarque)

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Exposição do impressionismo termina com recorde de público.

Atitude!

Moderna e arrojada era a conduta dos  impressionistas para sedimentar novos olhares à sociedade ainda tão fechada.  Artistas  instruídos,  profundamente estudiosos nas técnicas e movimentos que os antecederam, romperam com as poéticas passadas e abriram-se à experiência do ar livre, libertando-se da solidão dos ateliês em busca hábitos e valores das classes menos abastadas que não frequentavam os salões de arte. 
Monet, Renoir, Degas, Cézanne, entre outros, foram reunidos num movimento que tomou o desafiante e criticado quadro de Degas: Impression, soleil levante (1872, imagem). O impressionismo foi uma investigação sobre as possibilidades técnicas, cientifizando cores e temas do mundo moderno, predominantemente trabalhadas às margens do Sena. Ignora-se claro-escuro e não há distinção entre positivo e negativo, ou luz e sombra, há efetivamente manchas que se justapõem , em firmes  e significativas pinceladas.
A pergunta que não quer calar é: por que mais de meio milhão de pessoas, cidadãos comuns como os retratados pelos impressionistas, aguardaram horas (chegando a 8 horas) nas filas ziguezagueantes pelos entornos do CCBB para fruírem desse acervo?
Podemos chamar de sedução a força que a arte exerce sobre nós? Neste caso, espectadores desfalecidos pela pulsão escópica, registram a obra de arte como puro objeto de desejo, simbolizado na felicidade da ilusão de ver-se vendo.
Por outro lado, estaríamos consumindo em massa, mais um gadjet produzido por outra força – a do capitalismo – tão perfeitamente articulado no discurso da histeria?

Não vamos negar a perplexidade que amantes da arte foram tomados ao perceberem tal acolhida da população. Nesse caso, o público brilhou e dividiu o protagonismo do evento. Que sirva de estímulo para novas iniciativas.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Frida Kahlo

Lacan contrapõe à experiência do belo, a implacabilidade do sublime, no qual não se dá a contemplação agradável e, sim, a experiência de uma dilaceração. Está ligado a uma pungente revelação, a tal dignidade da Coisa não é apaziguadora, mas nos joga na cara nossa frágil e violenta condição humana .
A arte de Frida Kahlo é espelho. Seus autorretratos refletem - mais do que uma mulher, mais do que a dor que arrebatava seu físico, mais do que a emoção de uma amor destrutivo e gozador, mais do que uma revolucionária política - refletem a condição humana a que estamos expostos.
Essa é a beleza e a dificuldade que temos diante de sua obra.
Futura estudante de medicina, com sequelas de uma poliomelite, sofreu um terrível desastre. Sua recuperação sobre uma cama de baldaquim permitiu um encontro com a arte. Sobre a cama pendia um espelho que revelou dor, beleza, cores e formas.
- Viva a vida! É a mensagem que deixa um pouco antes de morrer.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

SEMANA DE ARTE MODERNA: 90 ANOS


Lacan (1960) propõe a dúvida: a arte imita o que ela representa? Como imitação, a arte seria mais-que-real, é surreal. Ele mesmo mostra que vai além de apenas imitar, pois quanto mais o objeto é presentificado, enquanto imitado, mais nos abre ele a dimensão onde a ilusão se quebra e visa outra coisa. Faz surgir um objeto lustral, purificador, renovando sua dignidade, consertando a realidade.
A arte moderna se diferencia por convocar o espectador à incômoda invasão no interior do artista, desconhecido e imprevisível, que não é dado facilmente e exige um esforço a mais. A conhecida realidade não é fotografada pelo discurso do belo, mas envolve o sensório submetido ao imaginário do pintor explicitado por meio de sua re-criação estética. Lacan (1960) nos conduz a analisar o mistério sobre Cézzane e suas maçãs, a repetição do tema, aprimorando sua relação com o real, apontando para a permanente renovação guiada pela imaginação.
Eu proponho que olhemos a Homem Amarelo, de Anita Malfatti, como o brasileiro legítimo, tal qual Macunaíma: tropical, corajoso, multifacetado e polêmico. Neles, aperfeiçoávamos nossa relação com nós mesmos, com o mundo, com o real, gigantizado como Abaporu.
Quantas estruturas foram balançadas?
Quantas sementes lançadas?
Quanta certeza caída por terra para dar lugar ao novo?
A Semana de Arte Moderna parece menor sob a ótica de fevereiro de 2012, hoje representada por idosas telas e heróis empoeirados. Poucos tributos a eles, homenagens reduzidas a lembranças de museus, e reconhecimento limitado.
Até nossos dias, com tanta modernidade, ainda se torce o nariz ao diferente, àquilo que a estética determina que não é o belo sob sua tradicional vestimenta
Para muitos (e me incluo), não foi apenas um movimento, mas “O” movimento que disseminou tantos outros, que libertou nossa inspiração, que nos livrou da obediência ao pai europeu, tingindo de verde-amarelo nossas telas.
Nossa metamorfose.   

domingo, 22 de janeiro de 2012

Meia-noite em Paris

Meia noite em Paris foi a autorização que Allen se deu para alucinar a mais deliciosa aventura intelectual possível: encontrar com ídolos da arte do passado e com eles tecer um presente mais seguro.
A atemporalidade é a magia que permite o artista (escritor) passear entre aqueles que marcaram sua estética e, acima de tudo, ouvir sua opinião sobre temas sedutores à sua obra.

Como ultrapassar e viver a plenitude do tempo atual, sem ficar se reportando ao passado? Como permitir surpreender-se com o novo, sem entendê-lo como ameaçador? Como voltar ao passado e dele sugar memórias enriquecedoras, sem fixar-se na melancolia?
Não é saudosismo, nem modernidade, é simplesmente compreender o artista como deslocado de tempo, sempre atual e pleno de mensagens, seja de que época for.
Poderia ser assim em nossas vidas.

Sentimos o incômodo por depender de tantas inovações tecnológicas; em lidar com valores sociais mudados e diferentes das certezas responsáveis por limites construídos ao longo da vida. Tudo parecia mais claro antes. Tudo era mais próximo das leis passadas pelos pais, portanto mais palatáveis e sem muitas perguntas. Repetimos as vantagens do que chamamos de “no meu tempo”. Esses limites, fixados imaginariamente, passaram a indicar a zona de conforto, a recortar as fronteiras de nossas existências, aparentemente intransponíveis. Daí, o medo, a ansiedade, a estranheza de caminhar e escorregar fora da linha. Temos o horror imaginário, deliberadamente criado por se dimensionar os riscos de sair desse território seguro e conhecido: até hoje fui assim, agora está tarde para mudar.

Por outro lado, a forma de obsoletismo com que tratamos o que se foi no tempo não permite usar essa experiência tão rica para abrir oportunidades. Os milênios que nos antecedem são pródigos em modelos e metáforas para a vida de hoje.
Bem-aventurados os artistas que antecedem o comportamento social e privilegiam seu passado para abrir novos caminhos.

Como o inconsciente, a arte é atemporal.

domingo, 24 de julho de 2011

Amy Winehouse interrompida.

A música, morada do gozo, se encontra no fundo, fundo do inconsciente, como a manifestação privilegiada da arte, que pulsa por todos nós, aliviando as tensões. Essa era a arte de Amy. Sua voz se calou e vimos sua escalada ao templo das divas ser interrompida. Como outros ícones, limitou-se a poucos 27 anos de vida. Acompanhamos os escândalos e a degradação, em todas as esferas, em sua relação com a sociedade. 
Por ironia ou consequência, Amy prenunciava no próprio nome familiar – Winehouse - sua saga com a substância entorpecente e com a vida. Nesse descaminho, refletiu na sua criação Rehab a inconsistência da reabilitação nos moldes em que vinha sendo realizada, apontando sua dor para a insuficiência paterna em não intervir tão efetivamente em sua vida como seus “pais musicais simbólicos” haviam feito – Ray Charles e Donny Hathaway.
They tried to make me go to rehab,
But I said 'no, no, no'
Yes, I've been black, but when I come back
You'll know-know-know
I ain't got the time
And if my daddy thinks I'm fine
He's tried to make me go to rehab
But I won't go-go-go.
I'd rather be at home with Ray
I ain't got seventy days
'Cause there's nothing
There's nothing you can teach me
That I can't learn from Mr. Hathaway
I didn't get a lot in class
But I know it don't come in a shot glass
Cada sujeito, na toxicomania, estabelece uma relação diferente com sua substância de escolha. Os movimentos compulsivos, repetitivos e progressivos, exigem cada vez mais o estado de prazer – o estado de Nirvana, capturado do budismo para simbolizar a libertação do sofrimento, a busca do êxtase máximo. E o caminho da pulsão, ensina Lacan, é transgressor, como diz Amy: não quero me perder do bebê(r), por isso deixo a garrafa por perto.
The man said "why do you think you're here?"
I said "I got no idea.
I'm gonna, I'm gonna lose my baby,
So I always keep a bottle near."
He said "I just think you're depressed,
Kiss me here, baby, and go rest."
Ceder à exigência de prazer ou atender à proibição de não beber novamente? A saída estratégica é recorrer a objetos (drogas) que, aparentando serem controlados inicialmente, satisfaçam à exigência pulsional. Ledo engano, uma vez que nenhum objeto ou substância pode cumprir essa missão, pois o princípio do prazer se caracteriza pela impossibilidade de satisfação. E o sujeito pede mais, mais, mais: a garrafa à mão é bem mais fácil do que encontrar um amigo.
Este é um convite a olharmos com mais atenção e respeito aos sujeitos da arte. Como qualquer um de nós, eles portam dificuldades e trazem apelos, difíceis de serem escutados, pois se travestem de personagens que nos deliciam e nos cegam.
It's just 'til these tears have driedI don't ever want to drink again
I just, ooh, I just need a friend
I'm not going to spend ten weeks
And have everyone think I'm on the mend
It's not just my pride

quinta-feira, 24 de março de 2011

Música e Psicanálise

O fundo musical subjaz aos sentimentos, emerge nos momentos de transbordamento e - quando falta a palavra - nos transporta das letras às notas.
Aquela que toca o coração, aquela que - só ela - exprime o indizível. Apaziguada-dócil ou subversiva-arrebatadora se escuda no simbólico para representar.
Ali no fundo, paira fascinante, associada às imagens, aderida às percepções, mas autônoma e onipotente. Bem no fundo, transita livre - da felicidade extrema à insuportável tragédia - fazendo ela-mesma brotar os sentimentos e esvair-nos no imaginário.
A música, morada do gozo, se encontra no fundo, fundo do inconsciente, como a manifestação privilegiada da arte, que pulsa por todos nós, aliviando as tensões.
Ali, bem no fundo, espreita a música, que traz o resto, dando a nós um fragmento do real.

http://www.facebook.com/georgeanabonow


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terça-feira, 1 de março de 2011

Buscar o cisne negro dentro de si.

No excelente filme - dirigido por Darren Aronofsky e estrelado por Natalie Porter – essa solicitação dirigida para Nina foi a queda insuportável da bengala imaginária (auto-erótica) que sustentava a jovem bailarina psicótica e a permitia levar uma vida mais ou menos organizada. Sua saída sempre fora se situar no ideal de “boa menina”, de cisne branco.

Ao ser solicitada a provocar a emergência do cisne negro, Nina desencadeia seu encontro com o real não simbolizável e vê desabar sua identificação com o significante líder de sua existência: boa menina. Essa operação a leva ao surto psicótico, momento em que, em sensacional inversão, somos nós-mesmos, os espectadores, levados a não conseguir mais distinguir as fronteiras entre verdade e delírio. Deslizamos no delírio de Nina e assim passamos a entender a dor do surto psicótico.
Fora do discurso, a personagem mostra sua impossibilidade de transitar nos laços sociais, medir relações, equilibrar-se e se submeter ao jogo social. Alucinação, delírio e arte são tentativas de simbolizar aquilo que não consegue ser dito e sempre na linguagem referida ao corpo, sob os ideais maternos. Tentativas que se mostraram inúteis para restabelecer os vínculos rompidos e resgatar a estabilidade com que vinha conduzindo sua vida.
Na luta entre os cisnes, ao tentar romper com a "boa menina",  o corpo se deforma e sua organização de vida se desvanece.
Não é à toa que é no espelho que se despedaçam os cisnes branco e negro, momento em que Nina se assume (totalmente identificada) o significante do ideal traçado pela direção do balé: o cisne negro.
Foi perfeito, diz ela.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Onde a Psicanálise e a Arte se encontram

Na literatura psicanalítica, tem sido relativamente comum estudar artistas e suas obras, capturados da arte, para aprofundar conceitos da psicanálise. Tanto Sigmund Freud (1856-1939), como Jacques Lacan (1901-1980), em suas obras reconhecidamente referências dos conceitos prevalentes da psicanálise, olharam com profundo interesse para as artes e delas retiraram elementos importantes sobre os processos mentais. A experiência psicanalítica se dá pela linguagem, arte é linguagem, daí compartilharem de um lugar comum: ambas oferecem ao Outro uma interpretação, um sentido, e dele obtêm o silêncio, a falta que reorganiza e que permite a emergência do sujeito.