terça-feira, 9 de março de 2010

O chiste de Woody Allen.


O intelectual judeu da modernidade teve que buscar trabalho fora do gueto, num espaço em que os critérios de aceitação e consideração eram bem diversos, submetidos a um esforço bem maior em prol da ascensão social, participando da estrutura competitiva num confronto inevitável. Freud, Einstein, entre tantos brilhantes judeus tiveram que superar esta barreira, uma resistência que, no dizer de Freud, era preciso encarar como vantagem (FUCHS, 2000).
Não foi diferente para Allen nos anos pós-guerra. Desprovido de dotes físicos, e muito tímido, ele se tornou o mais severo crítico de si mesmo e das condições difíceis que se impunham ao seu caminho. Com sua inteligência fina e peculiar, na trilha sublimatória da arte, edifica com sua espirituosidade, a ponte para ultrapassar a timidez e desvantagens, e estabelecer seus laços sociais. As tiradas espirituosas que ele construía sobre aquela realidade eram capazes de fazê-lo comunicar-se agradavelmente com outras pessoas, ainda que as criticando e às suas vidas. Descobria ele a técnica da tirada espirituosa. Explica Allen a virada que lhe permitiu chegar ao sucesso: “eu era judeu, mas depois me converti ao narcisismo”.
O Witz, na tradução para o português da obra de Freud da Imago, é o chiste; em francês adotou-se mot d'esprit. Na tradução do Seminário de Lacan, o Witz é a tirada espirituosa. O chiste não é uma palavra comum na língua portuguesa, mas todos sabemos o que é uma tirada espirituosa, ainda que não tivéssemos lido Freud.
Espírito, para Aurélio Buarque de Holanda tem significados diversos na língua portuguesa: a parte incorpórea, inteligente ou sensível do ser humano; o pensamento; a mente; inteligência fina, brilhante; idéia predominante; significação, sentido; capacidade de captar o cômico, o divertido, o ridículo; graça, humor; ironia.
É nesse caminho que nos conduziu Freud, e depois Lacan, para melhor compreendermos a importância do Witz. Uma das primeiras menções de Freud sobre o Witz data de 1899 (volume III), em Recordações Encobridoras. Logo a seguir, em 1905, Freud publica O chiste e sua relação com o inconsciente, mergulhando seu estudo num tema privilegiado por Lacan, quando escolhido para a abertura de seu seminário de 6 de novembro de 1957 (livro 11), ao qual se refere como: “a mais brilhante forma com que o próprio Freud nos aponta as relações com o inconsciente”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário